Monday, December 3, 2007

Et voilà

É sempre bom ser alvo de um argumentum ad hominem por parte de alguém do calibre intelectual do Zé Neves. Pena é - e confesso a minha desilusão - que haja pouco para discutir, à parte das minhas funções profissionais e do bias que daqui adviria (que as pessoas possam pensar para além das suas funções profissionais é algo que certas pessoas não percebem: deve ser da "funcionarização da mente" que projectam nos outros). Se o Zé Neves não quis perceber o alcance da minha argumentação aqui, que era um comentário - mas que devia pelos vistos ter transformado em post, agora percebo e faço mea culpa -, é porque a levou para o lado pessoal ou, pior, "psicanalítico" (seja lá o que isso for; se houve alguma coisa que eu não tentei fazer foi psicanalizar ou psicologizar o que quer que seja, mas adiante; se o problema é a questão da "masturbação intelectual", tudo bem, terei pecado por excessiva informalidade - afinal de contas, o Zé Neves fez o favor de mostrar o contexto em que nos conhecemos [como se isso tivesse a mais pequena relevância para o quer que seja], por isso não preciso de repetir -, mas isso não tem nada a ver com a substância do comentário; retire-se isso e o resto mantém-se por inteiro).

O problema é que o Zé Neves me acusa - de não ser capaz de separar o público do privado - daquilo do que ele próprio é incapaz, mas a uma escala, para o debate político, com consequências muito mais negativas. Para o Zé Neves, o cargo das pessoas é sempre mais importante do que as pessoas dizem. Nada disto é novo. Como há uns tempos referi a propósito de outra polémica, há uma esquerda especializada* no uso e abuso da falácia genética, cujo mandamento é mais ou menos assim: "não discutas o que a pessoa diz/escreve, discute de onde ela vem/o que ela faz". É uma espécie de uso pedestre da sociologia do conhecimento.

Eu podia começar a prescrutar o currículo político-académico do Zé Neves, ver as suas clientelas e de quem é ele cliente, se já foi do PCP, se agora é do BE, a mando de quem é que ele escreve, etc., etc., etc.. Não o faço como o nunca o fiz, porque para mim isso não só é o grau zero do debate político (ou outro), como, sobretudo, define quem usa e abusa desses argumentos. Como dizem os sociólogos, esses especializados nessa falsa ciência «a meio caminho entre a futurologia e a demografia» - eu adoro estes argumentos de quem não tem um pé epistemológico em que se aguentar, ou não pretende reivindicar nenhum - quem dessa forma classifica, classifica-se.

Depois com mais tempo tentarei procurar explicar melhor o que quis dizer no comentário em causa, porque ele era, antes de mais, impessoal. E o Zé tem razão quando escreve: «Antes porém, e para desdramatizar, convém dizer que as bocas do Hugo Mendes não configuram um ataque dirigido especialmente contra mim. Um outro qualquer Hugo poderia mandá-las a um outro qualquer Zé». Exactamente, Zé: tivesses levado esta tua frase a sério e tinhas feito melhor figura, terminando o teu post por aí. Há pessoas que enfiam o barrete tão fácil como desnecessariamente.

E se a levasses ainda mais a sério, farias um debate de ideias - e desculpa, mas estão algumas no meu comentário em causa, mesmo que não gostes delas; se discordas, contrapõe com outros argumentos - e não um chorrilho de insultos, que é a única coisa que o teu post contém. A este tipo de coisas, meu caro, eu faço como os adversários do Benfica a cada cruzamento do Luís Filipe: "desses venham mais".

* Felizmente esta esquerda não é toda a esquerda. Dos inúmeros e quentes debates que tive, por exemplo, com o Renato Carmo no Peão ou - em menor número, é certo - com o João Rodrigues nos Ladrões de Bicicletas, nunca nenhum destes dois bloggers, no meio do calor e da violência da discussão, teve a necessidade de dizer que eu trabalhava para X ou falava em voz de Y. Para eles, e para todos aqueles com quem ainda vai sendo possível discutir política a sério, a minha pequena homenagem.

1 comment:

CLeone said...

Esquerda, os chavistas locais?Felizmente, esta esquerda não é esquerda, sequer. Embora abuse do nome, constantemente...