Uma das máximas do nosso tempo parece ser esta: «não endividirás as gerações futuras».
(curiosamente, muitos dos que estão preocupados com a dívida pública e com as obras 'faraónicas' preferem ignorar o nosso legado ecológico.)
Este raciocínio é perigosa e injustamente míope. Esquece que a solidariedade intergeracional é uma estrada com dois sentidos. Por ela não viajam apenas aquilo que os nossos filhos vão ter que pagar, mas aquilo que lhes deixamos – e que eles não produziram, mas vão usufruir. Estamos habituados a pensar desta forma em relação às famílias, mas a mesma lógica também se aplica às sociedades/economias nacionais.
Para sermos mesmo rigorosos e quisermos que uma geração não pague as dívidas contraídas pela geração anterior, então temos de ser coerentes e impedir que ela usufrua da riqueza criada no passado. Assim, cada geração tinha que destruir tudo o que construiu/produziu para evitar que a geração seguinte usufruísse das auto-estradas, escolas, hospitais, bibliotecas, museus, descobertas e aplicações científicas, etc. que construiu.
Naturalmente, não devemos ignorar que as gerações futuras pagam sempre um custo de oportunidade: se as políticas que uma dada geração desenhou e implementou forem más e ruinosas, será a geração futura a pagar as suas consequências; se elas tivessem sido mais inteligentes e eficientes, a geração futura obterá os seus frutos. O problema é que aqui entramos numa lógica contrafactual mais complicada: e se tivéssemos feito X ou não Y?
Depois, há coisas que não se pagam. Por exemplo, a geração que nasceu imediatamente a seguir ao 25 de Abril (escreve-vos alguém que nasceu em 1976) beneficia de um bem público para o qual não fez nada para obter: um regime democrático.
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